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Achados & Perdidos

No domingo chuvoso peguei a caixa de sapatos do velho guarda-roupa onde
guardamos, há muito tempo, pedaços de nossa inútil existência. A moeda de
prata de dois mil réis; o anel imitando pedra preciosa que ela devolveu acabado
o rápido namoro de duas semanas; um ingresso partido ao meio para a matinê
do circo; o correio-elegante daquela paraguaia de olhos abertos e vivos suplicando
“no me olvides“ e que, dois dias depois desapareceu; o telefone da antiga
namorada, escrito a lápis num papel marcado com beijos invisíveis; a carta
do adeus, sempre fechada e que nunca tivemos coragem de abrir; o retrato
três por quatro esmaecido e borrado daquela que a gente lembra dolorosamente.
Quase invisível, encontramos a promessa de um encontro escrita a lápis
com letra fina e elegante de mulher no verso amarronzado de um maço de
cigarros Ascott: “Amanhã, sem falta na praça Maria Pia“. Passeamos o dedo de
leve nos objetos como se roçasse os pelos do braço na pele macia e perfumada
que desapareceu nas brumas do tempo.
Fechamos a caixa e jogamos no incinerador do prédio. E não nos lembramos,
infeliz ou infelizmente, se aquela frágil promessa de amor se cumpriu.

Juvenil de Souza promete nunca
mais abrir caixas de sapatos e nem o
velho e frágil coração. Mesmo porque
o que ele conta aqui é tudo mentira.


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